Cada dia 20 de Novembro, Dia da Consciência Negra, traz consigo uma nova oportunidade para reforçarmos o combate e a reflexão sobre o racismo em nosso país. Nos últimos anos, o termo racismo estrutural ganhou destaque sendo definido como a discriminação racial que está enraizada em nossa sociedade, e a discussão ajudou para que este tema ganhasse recortes em diversos segmentos onde antes a questão racial era pouco vista ou até mesmo ignorada.
Este é o caso do racismo ambiental, termo que pode ser definido como a distribuição injusta dos recursos e riscos ambientais entre diferentes grupos étnico-raciais, é o que explica Lays Helena Paes e Silva, doutora em Ciências Sociais pela Universidade de Coimbra: “Se formos considerar a variante racial, onde é que nós encontramos a maioria da população negra? Qual é a composição racial dos bairros que são mais afetados pela poluição, pela contaminação, pelo lixo e pela falta de acesso à energia? Isso está distribuído de forma injusta e tem um componente racial fortíssimo que vem historicamente sendo negado”.
Neste mês, durante a COP26 em Glasgow, representantes de movimentos negros brasileiro realizaram o evento “Terra, territórios e o enfrentamento ao racismo nas lutas contra a crise climática” para discutir sobre o racismo ambiental no Brasil, o que despertou interesse nesse tema de extrema importância para entendermos a profundidade da questão racial, mas que ainda é pouco discutido no país. Para se ter uma noção, no início de Outubro durante o Conselho de Direitos Humanos da ONU, o representante do Brasil no colegiado contestou o termo e seu uso pela ONU, “notamos que o chamado racismo ambiental não é uma terminologia internacionalmente reconhecida”.
Para Ivy de Souza, doutora em Direitos e Garantias Fundamentais Faculdade de Direito de Vitória- ES (FDV), o desconhecimento sobre o racismo ambiental ainda é muito grande, o que impede um debate mais aprofundado sobre a questão, “Ano passado mesmo participei do Congresso Brasileiro de Bioética, e a primeira pergunta que todos os mediadores das mesas me fizeram era ‘o que é racismo ambiental?’, então não é uma questão de desconhecimento apenas do grande público, mas inclusive do meio acadêmico”.
O termo racismo ambiental surgiu nos Estados Unidos no final da década de 1970 a partir dos movimentos de luta por justiça ambiental, e ganhou destaque em 1982 quando a população de Warren County, na Carolina do Norte, iniciou um levante contra a instalação de um aterro de resíduos tóxicos, graças a esses protestos veio à tona a denúncia que 75% dos aterros de resíduos tóxicos do sudeste americano estavam em bairros habitados majoritariamente por populações negras, provando que aquele não era um caso isolado.
No Brasil, os primeiros casos de justiça e de racismo ambiental começaram a ser denunciados ao final da década de 1980, graças a estudos de casos isolados, sobretudo no Rio de Janeiro. Em 2001, foi fundada a Rede Brasileira de Justiça Ambiental, durante o Colóquio Internacional sobre Justiça Ambiental, Trabalho e Cidadania, realizado no campus da UFF (Universidade Federal Fluminense).
Apesar do conceito do racismo ambiental não ter surgido no Brasil, para Ivy de Souza Abreu, o caso brasileiro tem algumas diferenças em comparação ao norte americano, “Por mais que seja a mesma ideia, o nosso racismo ambiental possui uma estruturação social diferente, se lá nos EUA o racismo ambiental está vinculado apenas as etnias, aqui está vinculado também desigualdade social. Se lá 100% das pessoas que vivem próximas aos lixões são negras, aqui 100% das pessoas são de baixa renda, então a pobreza também é um fator determinante na estruturação das pessoas que vão sofrer com o racismo ambiental no Brasil. É muito nítido essa diferença quando você compara um bairro de classe média e um bairro de periferia”.